As pessoas hesitam atravessar a ponte da
indiferença porque temem o encontro com
a própria dor ou condição.
Nos imaginamos sempre jovens, bonitos,
saudáveis e completos.
Não imaginamos as perdas, a solidão, a
velhice, a invisibilidade diante de uma
sociedade que prefere fazer-se cega.
O "isso só acontece com os outros" toca
mais nosso coração que o "e se fosse comigo?
E se fosse eu a ter perdido uma perna, o
emprego, o amor ou minha dignidade?"
Se os corações conseguissem criar asas
de vez em quando e colocar-se no lugar
do outro, eles seriam mais abertos, menos
cerrados e mais receptivos.
Eles teriam olhos, ouvidos atentos, braços
imensamente longos.
Evitamos os caminhos pedregosos, evitamos
as situações impossíveis e as lágrimas alheias.
Pensamos que não somos responsáveis pelos
males da sociedade e por isso mesmo não
devemos nos envolver.
Nunca nos vemos desse lado da ponte onde
carências existem e nem nos passa pela
cabeça que o fio que separa um lado do
outro seja tão ínfimo, tão frágil, tão
delicado.
Colocar-se no lugar do outro dói menos que
estar no lugar dele.
Mas nem essa linha queremos atravessar!...
Se o fizéssemos haveria menos solidão,
mais compreensão, menos suicídios, mais
esperança, menos marginalização e uma
possibilidade muito maior de um dia, se
por acaso estivermos, pelos contrários da
vida, do outro lado, uma mão estendida
na nossa direção.
© Letícia Thompson
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